Márcio TorresMárcio é Bacharel em Administração de Empresas pela Faculdade estadual do Tocatins e técnico em várias outras áreas entre elas na área imobiliária, sempre estudioso da ciências sociais sendo um pensador liberal e escritor e consultor
Por Márcio Torres.
Em 21 de julho de 1975, uma bomba artesanal explodiu no Cine‑Teatro Apolo XI, em Cajazeiras, Paraíba, matando duas pessoas e ferindo outras duas. O dispositivo foi colocado próximo à cadeira habitual do bispo Dom Zacarias Rolim de Moura, que, por coincidência, não estava presente na sala naquele momento – encontrava‑se no Recife escolhendo filmes que seriam exibidos no local (polemicaparaiba.com.br).
Foram dois os mortos na tragédia, segundo registros da época: o soldado Altino Soares (“Didi”) e Manuel Severiano. O episódio deixou a população em choque, agravado pela hipótese mais contundente levantada: seria um ato político cometido por grupos de oposição à ditadura militar .
Segundo relatos apresentados pelo jornalista Francisco Salles Cartaxo Rolim, que pesquisou o caso para o livro Do Bico de Pena à Urna Eletrônica, existia a convicção entre moradores de que o atentado tinha motivação política clara. O alvo era o bispo conservador, e o objetivo – atribuir falsamente a autoria ao opositor local e advogado João Bosco Braga Barreto, líder destacado da oposição regional ao regime militar (polemicaparaiba.com.br).
Bosco Barreto, na época deputado estadual e figura central do MDB no sertão paraibano, chegou a solicitar, em 1985, a reabertura das investigações ao Ministério da Justiça, equiparando o caso ao atentado de Riocentro (polemicaparaiba.com.br). Ainda assim, o pedido não foi levado adiante pelas autoridades da chamada Nova República.
O atentado de Cajazeiras remete a uma estratégia mais ampla usada por setores radicais das Forças Armadas naquele período: explodir bombas para criar clima de instabilidade – culpando a esquerda –, e assim retardar a abertura política. Os casos de Riocentro e da sede da OAB, ambos em 1981 e 1980 respectivamente, são exemplos marcantes desse padrão (diariodosertao.com.br, pt.wikipedia.org).
No episódio de Riocentro, uma dupla de militares (sargento e capitão do DOI-CODI) preparou bombas para explodir em um show de comemoração do Dia do Trabalho, sob a alegação de que grupos de esquerda estavam por trás. Uma explosão falhou e revelou que o ataque foi obra interna das Forças Armadas (pt.wikipedia.org).
Também em 1980, uma carta‑bomba enviada à OAB atingiu a funcionária Lyda Monteiro, resultando em sua morte. Meses depois, em crimes semelhantes na Câmara Municipal do Rio e no jornal Tribuna da Luta Operária, percebeu‑se o mesmo padrão: ações de falsa bandeira atribuídas à esquerda, mas atribuídas depois à linha‑dura, com envolvimento do SNI e do DOI‑CODI (pt.wikipedia.org).
De acordo com o relato de Cartaxo, o Cine‑Teatro Apolo XI já estava às escuras quando a bomba explodiu. Muitos dos espectadores já haviam saído porque o filme chegava ao fim. Por isso, o número de vítimas foi menor do que o potencial, estimado entre 100 e 150 mortos (polemicaparaiba.com.br).
E mais: se o atentado tivesse ocorrido com o local lotado, autoridades locais acreditam que a repercussão seria global. O alvo – o bispo, líder moral conservador – e o “ato falho” do regime – atribuir o crime a Barreto – teriam transformado a tragédia em escândalo infernal.
O cine-teatro seguia uma sessão normal. Muitos frequentadores resolveram sair cedo, pelo horário ou curiosidade — um movimento que, inadvertidamente, impediu uma tragédia muito pior .
O fechamento prematuro das portas, praticado pelo proprietário ou por razões técnicas, interrompeu a plateia lotada e salvou dezenas de vidas.
Décadas depois, o inquérito ficou engavetado até a criação da Comissão da Verdade na Paraíba. Documentos colhidos entre 2011 e 2016 mostraram uma investigação conduzida em sigilo, sem conclusão definitiva sobre a autoria (auniao.pb.gov.br).
Até hoje, as dimensões completas do atentado ao Apolo XI não vêm à tona, sendo um capítulo pouco conhecido da “guerra suja” no Brasil. O episódio permanece como um lembrete sombrio do potencial do Estado em protagonizar atos de terror interno para proteger um regime em colapso.
Três atentados nacionais (OAB, Riocentro e, especialmente, o ocorrido em Cajazeiras) podem ter sido parte de operação do SNI/Exército para incriminar a oposição.
A motivação: desacreditar a oposição local (com foco em Bosco Barreto) e deteriorar o processo de abertura política.
A tragédia foi contida por fatores fortuitos — horário e público reduzido.
A autoria e os responsáveis jamais foram responsabilizados ou devidamente investigados.
A história de Cajazeiras, assim, se entrelaça a um mecanismo repressivo nacional, estampando como símbolo de uma engrenagem política que traficava terror para prender o país num medo fabricado.
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